quarta-feira, 10 de abril de 2013

O duelo


Quando as leis já não eram mais suficientes (e quem poderia alterá-las, por conveniência, nada fazia), a Justiça, que não tinha mais a serpente aprisionada sob seus pés, decidiu agir por conta própria e chamou a Impunidade, que se prevalecia em meio à sociedade, para um duelo de vida ou morte. Em jogo, o futuro de toda uma nação.
A desafiante e a desafiada encontraram-se no lugar previamente combinado. A Justiça, com os olhos vendados e sua espada reluzente, largou a balança, que sempre carregava, para melhor duelar. Jamais admitiria, mas não acreditava mais naquele equilíbrio. As Leis todas tinham sido pisoteadas pela Impunidade, que agora provocava, irritantemente, a Justiça.
-O fato de a Impunidade imperar – falava de si em terceira pessoa – É um indício claro de que a Justiça é falha.
-A Justiça não é falha – defendeu-se a cega dama – Mas fracassará se não tiver o apoio de Leis rígidas e eficazes. Sozinha, a Justiça não poderá vencer nenhuma batalha - E dizendo isto, esperava que novas Leis se erguessem para auxiliá-la.
-Cale-se, sua tola! – Atalhou a Impunidade - Discursos ingênuos não são armas para uma guerra!
-A arrogância de uma força em ascensão também não.
-A Impunidade tem caminhado com o homem, lado a lado, desde o princípio dos tempos, para mostrar que a Lei nada mais é do que um ideal. Uma utopia. Não fala aqui a voz da arrogância, mas sim a da razão. A da certeza. A Justiça foi gerada, precocemente, para encarar uma batalha perdida, pois o homem, que a representa e dá luz às suas Leis, é corruptível e imoral.
-A Justiça, assim como suas Leis, está aqui para provar que existe um equilíbrio na balança – insegura, a Justiça encarou o referido instrumento caído á uma considerável distância – E que para os infratores, existe punição! – E empunhou ameaçadoramente a sua espada.
A Impunidade lançou-se, repentinamente, de mãos nuas, sobre a desafiante. A espada da Justiça trespassou, num único movimento, o peito da Impunidade, que gargalhou loucamente e, com a espada ainda cravada no tórax, esbofeteou seguidamente o rosto de sua rival, chutando-a, assim que esta caiu, e cuspindo em sua face. Impunidade retirou, sem expressão de dor, a espada que a importunava e quebrou-a com o mínimo esforço empenhado. Prostrada no chão, humilhada, abafada pela Impunidade, que mantinha o pé sobre suas costas, a Justiça respirava com dificuldade.
-Preparada para o Grand Finale? – Perguntou, em tom de deboche, a Impunidade.
-Sim... Eu tinha razão... Sem boas leis, não se pode fazer justiça.
Sem hesitar, a Impunidade debruçou-se sobre a Justiça e partiu seu pescoço com uma única torção. A vitoriosa pulou sob a carcaça de sua desafiante e correu em direção ao Caos e à Injustiça, irmã gêmea má da perdedora daquele duelo, que assistiam a tudo de camarote. Em meio á comemoração, abraçaram-se emocionada e demoradamente.
A Injustiça, a Impunidade e o Caos partiram. Havia, ainda, muito trabalho a fazer e novas leis a disseminar.

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